AUTOESTIMA: Será que Isso Existe?
A autoestima é um conceito onipresente em nosso cotidiano, evocando uma sensação de importância e necessidade. Contudo, se examinarmos sua etimologia, vemos uma clara contradição. “Auto” deriva do grego autós, significando “por si mesmo”, e “estima” provém do latim aestimare, que se refere a avaliar, julgar ou atribuir valor. Assim, a autoestima pode ser interpretada como “julgar a si mesmo como valioso”.
Mas será que a natureza do “eu” pode mesmo se arrogar a capacidade de emitir tal julgamento? Haverá um “juiz interior” capaz de nos avaliar com imparcialidade, veracidade e afeto? Ou seria a autoestima meramente uma faceta do ego em sua incessante busca por validação? Carl Jung, com sua vasta exploração da psique, diz que a mente não é monolítica. Inúmeras vozes ressoam em nosso interior – complexos autônomos, arquétipos vivos – manifestando-se como personagens com percepções distintas sobre nossa identidade. Ao afirmarmos “minha autoestima está baixa”, quem está proferindo tal afirmação e quem está sendo avaliado?
No fundo, talvez a questão não resida na autoestima, mas em uma profunda falta de familiaridade com o próprio ser. É nesse ponto que tradições milenares oferecem perspectivas esclarecedoras. Elas narram que a concepção de um eu que necessita de autoavaliação é ilusória. O Ser em essência não demanda autoestima, pois não se define, não se compara, não se julga; ele simplesmente é. No Tantra, o corpo, a mente e até mesmo as sombras são compreendidos como manifestações desta própria consciência em ser. Por isso não há valor a ser atribuído; ele é intrínseco.
O cerne do problema, acredito, pode estar na tentativa de quantificar o incalculável, de atribuir uma pontuação à vastidão que somos. A autoestima, nesse sentido, pode ser uma armadilha conceitual: um artifício contemporâneo para perpetuar a crença de que é preciso provar o próprio valor, até mesmo para si, num esforço contínuo, por vezes angustiante, de buscar aprovação onde nenhum tribunal deveria existir.
E está nesta exata perspectiva que reside a distinção fundamental entre autoestima e autoconhecimento. Se a autoestima é um julgamento de valor – “sou bom o suficiente?” –, o autoconhecimento, por outro lado, é um processo de observação e compreensão de si. Não envolve atribuição de valor positivo ou negativo, mas sim o reconhecimento do que é. É uma jornada introspectiva para explorar suas emoções, pensamentos, padrões de comportamento e motivações, sem a necessidade de uma sentença final sobre seu mérito.
Ao se conhecer melhor, você não se declara “eu sou X, e X é bom ou ruim”. Em vez disso, você percebe: “eu reajo a essa situação de tal forma devido a uma experiência passada”, ou “este pensamento surge em mim sob pressão”. O autoconhecimento é uma investigação contínua, uma busca por clareza sobre o próprio funcionamento, sem o peso da avaliação, muito menos da performance.
Enquanto a autoestima pode ser uma construção mental baseada em comparação e julgamento, o autoconhecimento é uma ferramenta de discernimento, importante para desvelar a verdade sobre quem você é, sobre o que você é, sem a necessidade de validação.
Talvez o que exista de fato seja apenas a autoaceitação, que dispensa julgamento, ou uma entrega mais radical: a de simplesmente ser.